Tubo errado no exame certo: o clássico que ninguém confessa

exame

Dá para montar uma novela inteira apenas com histórias de:

  • tubo errado
  • volume insuficiente
  • amostra hemolisada
  • material inadequado para o exame solicitado

A maioria fica escondida atrás de uma frase inocente no sistema:

“Exame cancelado, material insatisfatório.”

Limpinho, neutro, técnico.
Mas por trás dessa frase existe um problema bem maior do que uma sigla bonitinha no LIS.

O que significa, na prática, “tubo errado”?

Na rotina, aparecem variações conhecidas:

  • exame que precisava de citrato em tubo azul, mas veio em soro
  • exame que exigia jejum, mas ninguém checou
  • volume mínimo não atingido, tubo subpreenchido
  • amostra colhida após a janela ideal

Na tela, o desfecho é simples: cancelar, refazer, justificar.
Na vida real, é um estrago em cadeia.

O impacto real para o paciente e para o médico

Quando o tubo errado chega ao setor técnico, o drama é sempre o mesmo:

  • o paciente é chamado de volta para nova coleta
  • o médico precisa esperar mais um dia para ter o resultado
  • a confiança na qualidade do laboratório toma um arranhão silencioso

E ninguém sai contando por aí:

“O laboratório errou o tubo.”

A narrativa costuma ser mais genérica:

“Tive que voltar porque deu problema no exame.”
“O laboratório teve que refazer.”

Na cabeça do paciente, “problema no exame” é o laboratório, não o pré analítico.

O custo que não aparece na planilha

Cada tubo errado ou amostra inadequada gera:

  • gasto de insumo que não virou laudo
  • uso de reagente sem resultado aproveitável
  • tempo de técnico jogado fora
  • energia da equipe de coleta consumida em repetição
  • atendimento para remarcar paciente
  • desgaste com o médico que está esperando

Nada disso aparece numa coluna bonita chamada “custo do erro pré analítico”.
Fica diluído no dia a dia, como se fosse parte natural da rotina.

Não é.

Por que o problema nasce na coleta e morre no LIS

O erro costuma acontecer na ponta:

  • padronização fraca por tipo de exame
  • comunicação ruim entre pedido médico, cadastro e coleta
  • treinamento superficial ou puramente teórico
  • ambiente de trabalho pressionando por velocidade acima de tudo

Só que o registro final fica no sistema, quase sempre com algum código genérico.
No relatório para diretoria, o que se vê é:

  • número de exames cancelados
  • uma legenda discreta sobre “material insatisfatório”

Sem rastrear corretamente:

  • qual tipo de exame mais sofre
  • qual unidade erra mais
  • quais horários concentram mais falhas
  • quais coletores precisam de apoio

Enquanto isso, o laboratório segue discutindo custo de reagente, tabela de convênios e produtividade, como se o problema estivesse apenas na máquina e no faturamento.

A cultura do “finge que é exceção”

Um dos obstáculos mais fortes é cultural.

Ninguém gosta de admitir:

“Eu colhi no tubo errado.”
“Eu não conferi o volume mínimo.”

Virou um pacto informal de suavizar o problema no registro, para não expor ninguém.

Só que, ao proteger pessoas do constrangimento imediato, o laboratório se condena a repetir o erro.
Não se analisa padrão, não se ataca causa, não se corrige processo.

Perguntas que apontam para o tamanho da ferida

Se o seu laboratório registra “material insatisfatório”, vale encarar com frieza:

  • qual a taxa de exames cancelados por esse motivo nos últimos 3 meses?
  • quais tipos de exame concentram a maior parte desses cancelamentos?
  • quantos pacientes foram reconvocados só por falha de tubo, volume ou preparo?
  • existe alguma unidade com taxa desproporcionalmente maior?
  • alguém apresenta esses números de forma clara para a direção?

A resposta para essas perguntas revela se o laboratório enxerga o problema ou só convive com ele.